Este mundo novo precisa que governos, empresas, instituições financeiras e sociedade civil se comprometam a parar e começar a reverter a perda da natureza, como uma defesa à saúde humana.
Escrevo-vos da minha sala, o meu novo escritório. Provavelmente, estão a ler as minhas palavras na vossa sala, o vosso novo escritório. Ouço os pássaros da janela, vejo o verde da janela e sinto a brisa fresca se a abrir. E sei que a vocês acontece o mesmo. Porque o mundo, como o conhecemos, está diferente.
Para alguém como eu que trabalha há 15 anos na área ambiental, os últimos 18 meses foram tempos excitantes. A discussão sobre a crise da natureza e da biodiversidade global atingiu níveis sem precedentes, e os efeitos das alterações climáticas foram primeira página em muitos media, contribuindo para que todos nós começássemos a valorizar mais a natureza e tudo o que ela nos dá.
Este era o super-ano para o ambiente, com múltiplas cimeiras a acontecer por todo o mundo, com o Pacto Ecológico Europeu a tomar forma, com greves climáticas e o foco das pessoas nas alterações climáticas, esse vilão que ameaçava todos os nossos futuros.
O mundo tem agora um novo vilão – e com a devida justiça. O Coronavírus conseguiu aquilo que mais ninguém até hoje havia conseguido: travar o business as usual político, a indústria e todas as atividades que contribuem para o aquecimento global do planeta e para a destruição da natureza. É disruptivo e destruidor para os humanos – mas apenas para eles. Olhem à vossa volta: cessou a atividade humana, mas a natureza permanece. Melhor, até se renova.
A natureza é a base para a produção dos bens mais comuns e grande parte do nosso modo de vida. Os oceanos e os recifes de coral fornecem comida e meios de subsistência a centenas de milhões de pessoas. As florestas limpam o ar, regulam o clima local e retêm a água dos rios.
Solos saudáveis são essenciais para o cultivo. Montanhas e glaciares são as principais fontes de água dos principais rios. Cada vez mais, a fragilidade dos ecossistemas apresenta enormes riscos à estabilidade social e económica.
Simplesmente, a natureza é a base de uma sociedade saudável, justa e próspera para todos. Estima-se que os benefícios da natureza ascendam a $125 biliões por ano – o dobro do PIB mundial. Mas como todos podemos atestar neste momento, qual é o real preço de um passeio no jardim a respirar ar puro?
2020 vai ficar para a história pelos piores motivos – a pandemia e a situação de catástrofe social e sanitária que causou.
Há muito que podemos já analisar e sobre o qual é imperativo refletir: a pandemia trouxe à luz a importância da ação imediata e preventiva; que os governos mundiais podem e devem dar largos passos para proteger as suas populações; que a cooperação internacional é fundamental para lidar com crises globais – estamos todos juntos, e trabalhando juntos podemos ter mais e melhores resultados.
Falta agora acrescentar a estas reflexões a reflexão sobre a importância da natureza. Se cuidarmos dela, ela cuida de nós. Um planeta em stress é um ecossistema menos resiliente, que põe pessoas, sociedades e economias em risco. É essencial ouvir mais os cientistas e especialistas que estudam a saúde do planeta, e fazer as ligações entre o equilíbrio dos ecossistemas, a saúde humana e a biodiversidade como forma de prevenir mais eventos destes no futuro.
Se dúvidas existissem sobre a importância vital da natureza, acredito que estas se irão dissipar. Milhões de pessoas em todo o mundo vão pensar mais na importância da natureza e como esta sustenta as suas vidas. Vão pensar mais na importância de continuar a alterar os seus comportamentos quotidianos, diminuindo a pressão sobre o nosso planeta e afetando a natureza positivamente.
Este mundo novo precisa que governos, empresas, instituições financeiras e sociedade civil se comprometam a parar e começar a reverter a perda da natureza, como uma defesa à saúde humana. Um novo acordo para a natureza e as pessoas está alicerçado num novo movimento para impedir a perda da natureza, e com isto, impedir a perda da saúde e de vidas humanas.
Escrito por Angela Morgado, diretora executiva da ANP/WWF
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